Como a arbitragem internacional tem decidido sobre indenizações?

JOTA.Info 2024-04-26

Uma das possibilidades da arbitragem que colaboraram para que a alternativa extrajudicial para resolução de conflitos ganhasse força é facilitar disputas comerciais envolvendo diferentes jurisdições. Entre as demandas mais comuns, está a busca por indenizações devido ao descumprimento de acordos. 

Em média, os autores de um processo arbitral recebem 40% do valor pleiteado, conforme revela a pesquisa recente “Arbitragem Internacional: estudo sobre danos”, realizada pela PwC no Reino Unido a partir de um período de três décadas de decisões. Por outro lado, os réus apresentam cálculo alternativo de somente 10% do montante pedido pelos requerentes. Assim, o resultado seria uma espécie de meio-termo. 

“A arbitragem é a forma adotada para a resolução de tais disputas porque, dentre outros benefícios, contribui para reduzir o risco de influência política nas decisões, dado que os procedimentos arbitrais usualmente ocorrem em câmaras neutras”, destaca Leonardo Lopes, sócio da PwC Brasil.

O estudo inclui julgamentos relacionados a arbitragens comerciais, ou seja, controvérsias entre empresas ou indivíduos em transações comerciais. Grande parte das sentenças pesquisadas está relacionada a arbitragens de investimento, quando um investidor estrangeiro alega que o governo anfitrião violou um tratado de investimento bilateral ou multilateral.

No total, foram analisadas 181 sentenças arbitrais proferidas entre 1990 e 2022. Dos julgamentos analisados, 70% foram do Centro Internacional para Resolução de Disputas sobre Investimentos (ICSID) e 15% da Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional (Uncitral) – geralmente, estas sentenças são mais acessíveis. 

Foram excluídas as sentenças em que a corte arbitral decidiu a favor do réu por motivos de jurisdição ou responsabilidade e que, portanto, não chegaram à fase de análise de danos. 

Nas sentenças analisadas, os tribunais arbitrais concederam, em média, indenizações de US$ 222 milhões. A maior indenização foi de US$ 8,5 bilhões. Cerca de 65% das indenizações foram inferiores a US$ 50 milhões, e somente 6% superaram US$ 1 bilhão. 

Em apenas 8% das sentenças, os requerentes recebem 100% do valor pleiteado. Em média, as indenizações correspondem a 40% do montante pedido. O mais comum é que os autores recebam entre 1% e 20% do valor reivindicado. 

Arbitragem na América do Sul

A região mais frequente nas sentenças estudadas é a América do Sul, seguida pela Europa Central, pelo Leste Europeu e pela África. 

“Grande parte dos países em desenvolvimento têm tratados bilaterais e multilaterais de investimento que visam proteger os direitos dos investidores estrangeiros. Esses tratados geralmente incluem cláusulas de arbitragem que permitem que os investidores estrangeiros levem suas disputas para tribunais de arbitragem internacionais”, explica Lopes. 

Por enquanto, o Brasil não adota o sistema de arbitragem de investimentos. Portanto, o estudo não possui casos envolvendo o país nessa seara. 

“Embora a arbitragem de investimentos seja amplamente utilizada em todo o mundo, o Brasil se mantém fora do mundo da arbitragem de investimentos devido à sua busca por maior autonomia e controle sobre questões de política econômica e soberania nacional. O país optou por fortalecer seus mecanismos internos de resolução de disputas e promover a segurança jurídica por meio de seus tribunais nacionais”, comenta o especialista. 

De acordo com Leonardo Lopes, são três as principais causas para a maior frequência da América do Sul nas sentenças arbitrais. A primeira é a grande exploração de recursos naturais, como petróleo e mineração. Estas são atividades que envolvem grandes investimentos estrangeiros e complexas estruturas contratuais, o que invariavelmente enseja divergências entre as partes envolvidas.

O segundo motivo é uma onda de nacionalização em países da região dos setores de petróleo, mineração e telecomunicações, que geram disputas entre investidores estrangeiros e o governo sobre compensações justas.

“Outro fator é a crescente conscientização e acesso à arbitragem de investimentos por parte das empresas e investidores. À medida que as empresas expandem suas operações globalmente, elas estão mais propensas a buscar a arbitragem como meio de resolver disputas, o que pode resultar em um aumento na representação da América do Sul e das demais regiões nas sentenças arbitrais analisadas”, completa.

O levantamento também identificou que, para mensurar os danos, requerentes e respondentes usam diferentes metodologias, que foram classificadas pelos pesquisadores em quatro tipos. Os principais são a“abordagem de lucro”, que  converte lucros (ou perdas) econômicas ao seu valor presente na data de avaliação; e a “abordagem de custo”, que engloba métodos para calcular custos irrecuperáveis. 

A abordagem de lucro foi o método utilizado por 64% dos requerentes, seguida de longe pela abordagem de custo, por 17%. Entre os réus, a situação é bem mais equilibrada: a abordagem de lucro foi usada por 33%, enquanto 26% preferiram a abordagem de custo. 

Já os tribunais arbitrais calculam o valor das indenizações com base na abordagem de lucro em 46% das sentenças analisadas. A abordagem de custo aparece em 31% dos casos. 

“Cada parte envolvida no processo de arbitragem tem seus próprios interesses e objetivos. Os requerentes geralmente buscam maximizar a compensação financeira que podem receber como resultado da disputa, enquanto os respondentes buscam minimizar os danos a serem pagos”, diz Lopes.

Os tribunais arbitrais devem analisar as alegações e as provas apresentadas pelas partes e tomar uma decisão imparcial. 

“Os tribunais podem adotar diferentes abordagens no cálculo de danos com base nas evidências apresentadas e nas normas jurídicas aplicáveis. A escolha da abordagem pode depender da jurisprudência existente, dos princípios jurídicos aceitos e das práticas comuns na arbitragem de investimentos”, completa o sócio da PwC Brasil. 

O estudo também quantificou a presença feminina nos julgamentos das causas arbitrais. Um quarto dos processos arbitrais tinham uma ou mais árbitras. A tendência é de ampliação da presença feminina: nos últimos anos, essa proporção subiu para um terço dos casos. Antes de 2015, nenhum tribunal arbitral tinha uma mulher em sua composição.