A razão e a emoção nas eleições de 2022

JOTA.Info 2022-07-12

Todas as perspectivas de explicação a respeito do resultado de uma eleição dão centralidade às motivações dos eleitores. Afinal, será a sua decisão que determinará quem vencerá a disputa. Diversos olhares buscam padrões em seu comportamento, formando as principais teorias eleitorais da ciência política. De forma simplista, todas elas lidam de maneiras diferentes com o que podemos chamar de “interesses e paixões” dos indivíduos, elementos que Hirschman indicou como sendo as motivações centrais do comportamento humano e que fundamentam o bom funcionamento do sistema capitalista.

Resumindo bastante, podemos considerar que os interesses se referem às motivações materiais da ação humana. Seriam as razões de nossas decisões voltadas a nosso benefício concreto e palpável. Então, os aspectos econômicos de nossa vida estariam associados, em geral, à esfera de nossos interesses. Já às paixões estão associados aspectos normativos de nossas escolhas, juízos de valores que sustentam nossas ações. Aspectos morais ou de justiça seriam um exemplo das paixões que nos motivam.

A escolha de um representante em uma democracia contemporânea envolve elementos que de alguma forma estão associados a estes dois lados. Somos movidos por nossos interesses e por nossas paixões, ora um deles prevalecendo e motivando a maioria do eleitorado em determinada direção. As teorias que buscam explicar estas decisões indicam que a performance econômica que precede a eleição é o fator mais importante a guiar a escolha do eleitor na eleição para presidente. Se, de maneira geral, esta teoria é bastante poderosa para nos trazer esclarecimentos sobre o resultado de uma eleição, permitindo até prognósticos, em casos específicos outras circunstâncias podem fazer o eleitor se decidir de forma mais apaixonada.

A eleição de 2018 no Brasil, por exemplo, foi fortemente influenciada por um sentimento antissistema, antipetista, com uma pretensão moralizante bastante evidente, por influência da Lava Jato e de todas as denúncias de corrupção que foram levantadas contra o governo de Dilma Rousseff, além de ter no episódio da facada ao então candidato Jair Bolsonaro um marco cujas consequências são difíceis de avaliar. São aspectos associados à paixão, refletidas nos elevados índices de rejeição ao PT, por exemplo, e que teriam justificado a decisão do eleitor naquela disputa particular.

Para a eleição de 2022, as pesquisas de intenção de voto vêm mostrando sistemática estabilidade na decisão de acordo com os principais institutos de pesquisa do país — com cerca de 45% dos eleitores indicando o voto para o ex-presidente Lula contra 30% para o atual presidente. Além disto, também tem apresentado informações bastante relevantes a respeito do que guia sua decisão.

Segundo a última pesquisa Quaest divulgada neste mês, 47% dos eleitores entrevistados avaliam negativamente o atual governo (mesmo dentre os que recebem o Auxílio Brasil) e 52% acham que o governo é pior do que o esperado. Embora a rejeição do atual presidente tenha se reduzido (já chegou a 67% dos entrevistados em novembro de 2021), ela ainda é bastante alta e significativamente maior do que a rejeição ao candidato petista (59 contra 41%). Central para entendermos o comportamento dos eleitores, 44% dos respondentes dizem que a economia é o principal problema do país hoje e 59% declaram que a situação econômica influencia “muito” seu voto para presidente. E nos maiores colégios eleitorais do país — São Paulo e Minas Gerais — a situação ainda é favorável ao candidato petista, embora a vantagem tenha se reduzido para 5 pontos percentuais na última pesquisa, contra 13 pontos no mês anterior.

Este cenário sugere que a dimensão dos interesses dos eleitores se situa favoravelmente ao ex-presidente Lula. Mas, como dito, não é apenas esta motivação que pauta o voto dos cidadãos e, em 2018, houve forte influência das paixões sobre as decisões.

Além disso, esta é uma eleição em que há componentes inéditos: desde 1989, é a primeira vez que um ex-presidente concorre novamente para disputar com o atual mandatário. No caso de sua derrota, seria a primeira vez que a reeleição não ocorreria desde que foi autorizada no Brasil, em 1998. Some-se a isso o comportamento de Bolsonaro, que sempre foi voltado para inflamar seus eleitores, criando situações em que o apelo à razão parece não ser buscado, nem mesmo desejado. Os questionamentos sobre a veracidade do resultado das urnas são o mais evidente exemplo. No sentido explorado aqui, o apelo às paixões é o seu comportamento estratégico.

No próximo mês, começam oficialmente as campanhas eleitorais e todos os olhos se concentrarão ainda mais na conduta dos candidatos que hoje lideram as pesquisas. Ao eleitor caberá a etapa final de um processo longo de disputa política. Se a sua motivação quanto aos interesses parece resolvida, o mesmo não se pode dizer sobre suas paixões. Ainda nos restam três meses para saber.