Cassação de Deltan Dallagnol: Entenda a decisão do TSE

JOTA.Info 2023-05-17

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) cassou na noite de terça-feira (16/5) o mandato de deputado do ex-coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba Deltan Dallagnol com fundamento na Lei Complementar 64/1990, que trata das inelegibilidades e sofreu alterações pela Lei da Ficha Limpa.

O ex-procurador da República foi alvo de representações apresentadas pela Federação Brasil da Esperança (PT, PC do B e PV) e pelo PMN, que argumentaram que Deltan Dallagnol não poderia ser eleito por ter antecipado o pedido exoneração do cargo no Ministério Público Federal para contornar a “possibilidade concreta” de instauração de 15 processos administrativos disciplinares (PADs).

Os autores salientam o dispositivo na lei que torna inelegíveis integrantes do Ministério Público que tenham pedido exoneração ou aposentadoria voluntária na pendência de processo administrativo disciplinar, pelo prazo de 8 (oito) anos’. Em seu voto, o relator ministro Benedito Gonçalves detalhou o dispositivo sobre a qual versa a inelegibilidade apontara ao ex-procurador:

Art. 1o São inelegíveis: I – para qualquer cargo: […] q) os magistrados e os membros do Ministério Público que forem aposentados compulsoriamente por decisão sancionatória, que tenham perdido o cargo por sentença ou que tenham pedido exoneração ou aposentadoria voluntária na pendência de processo administrativo disciplinar, pelo prazo de 8 (oito) anos; […].

O ministro ressalta que na terceira hipótese, “não é necessário haver penalidade, bastando que exista pedido de exoneração ou de aposentadoria voluntária na pendência de processo administrativo disciplinar (aqui considerado em sua acepção técnica: PAD) que possa, hipoteticamente e a princípio, levar a uma daquelas consequências”.

Para o relator, os elementos trazidos aos autos mostram de forma “cristalina” que o “ex-procurador exonerou-se do cargo de procurador da República em 3/11/2021 com propósito de frustrar a incidência da inelegibilidade”.

“É inequívoco que o recorrido, quando de sua exoneração a pedido, já havia sido condenado às penas de advertência e censura em dois processos administrativos disciplinares findos, e que, ainda, tinha contra si 15 procedimentos diversos em trâmite no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) para apurar outras infrações funcionais”.

À época da exoneração, não havia nenhum PAD aberto contra Deltan Dallagnol, mas tramitavam contra ele procedimentos de natureza diversa no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP): nove reclamações disciplinares, uma sindicância, um pedido de providências, três recursos internos em reclamações disciplinares e, ainda, uma revisão de decisão monocrática de arquivamento em reclamação disciplinar.

Gonçalves destaca que o ex-procurador da República pediu exoneração 16 dias após outro procurador da operação ter sido apenado com demissão em um PAD instaurado a partir de reclamação por contratar e instalar outdoor em homenagem à força-tarefa, com fotografia na qual o Deltan Dallagnol também aparece. O fato, segundo o relator, não teria “maior liame com o caso” se não fossem as circunstâncias.

O relator acrescenta ainda que “a mencionada exoneração do recorrido, ainda faltando onze meses para as Eleições 2022, ganha relevância no contexto da fraude à lei”. Isso porque membros do Ministério Público apenas precisam se afastar do cargo faltando seis meses para o pleito. O voto do relator foi seguido de forma unânime pelos outros integrantes do TSE.

Esse dispositivo sobre a inelegibilidade de integrantes do Ministério Públicos foi incluída na Lei da Ficha Limpa em uma atualização feita em 2010. A emenda é de autoria do atual ministro da Justiça, Flávio Dino, e foi apresentada em 2009, quando ele era deputado. Na justificativa, ele argumentou que a hipótese que considera o pedido de exoneração “é prevista para evitar que pedido de exoneração ou de aposentadoria voluntária seja realizado para afastar eventual inelegibilidade de membro do MP, o que seria verdadeira burla ao espírito deste Projeto de Lei Complementar”.

Dallagnol pode recorrer tanto no TSE, via embargos de declaração, quanto no Supremo Tribunal Federal (STF), porém sem mandato. A decisão de cassação foi cumprida de forma imediata. Os mais de 344 mil votos concedidos ao ex-procurador serão computados em favor do Podemos, legenda pela qual ele concorreu às eleições.

Registro de Dallagnol havia sido aceito pelo TRE-PR

O Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR) anteriormente havia julgado improcedentes as impugnações e deferido o pedido de registro de candidatura de Deltan Dallagnol.

Para o TRE-PR, a exoneração voluntária de Dallagnol não atrapalhou a continuidade da investigação probatória e a conversão dos expedientes em procedimentos administrativos disciplinares, pois a reclamação disciplinar, a sindicância e o pedido de providências podem, ou não, gerar a instauração do processo disciplinar, a depender das circunstâncias do caso concreto.

O acórdão aponta também que entendimento diverso implicaria “verdadeira interpretação ampliativa da norma de caráter restritivo, o que é vedado pelo ordenamento jurídico”. Para os julgadores do tribunal de origem, o juízo de valor a ser exercido pela Justiça Eleitoral é tão somente avaliar, objetivamente, se havia processo administrativo disciplinar em andamento, quando efetuado o pedido de exoneração pelo membro do MP. Também não cabe à Justiça Eleitoral analisar, subjetivamente, suposta intenção acobertada pelo pedido de exoneração formulado pelo candidato impugnado.