O controle externo da OAB pelo TCU
JOTA.Info 2023-08-30
Em outubro de 2020, escrevemos, junto com Marilena Indira Winter – hoje presidente da OAB-PR – artigo no JOTA[1] sobre o controle externo da OAB realizado pelo TCU. Na época, abordamos o Tema 1054 (“controvérsia relativa ao dever, por parte da Ordem dos Advogados do Brasil, de prestar contas ao Tribunal de Contas da União”). O relator, ministro Marco Aurélio, votou pelo provimento do Recurso Extraordinário e disse: “(…) a Ordem dos Advogados ( … ) é entidade pública, de natureza autárquica – especial e corporativista –, arrecadando contribuições de índole tributária (…)”. Em suma, o voto foi no sentido de que a OAB deveria prestar contas ao TCU.
Em divergência, o ministro Edson Fachin, cujo voto prevaleceu, citando julgamento da ADI 3026, afirmou que naquela oportunidade o STF havia julgado que a OAB é “serviço público independente, categoria ímpar no elenco das personalidades jurídicas existentes no direito brasileiro”. Enfim, citando sugestão do professor José Afonso da Silva, propôs a seguinte tese: “O Conselho Federal e os Conselhos Seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil não estão obrigados a prestar contas ao Tribunal de Contas da União nem a qualquer outra entidade externa”.
A decisão do STF, pelo voto do ministro Fachin, está em consonância com a Constituição. Embora estejamos acostumados às fôrmas classificatórias do Direito Administrativo, elas não são suficientes para formatar a realidade (como diz o ministro Fachin em seu voto, a OAB está na “categoria ímpar no elenco das personalidades jurídicas”).
A Constituição revela o papel da OAB em nossa ambiência jurídica. Menciona-a em diversas passagens – prevê participações em concursos públicos, a legitimidade para Ações Diretas de Inconstitucionalidade, a indicação de membros para o CNJ –, e ressalta a indispensabilidade da advocacia (art. 133). Não se encontra no mesmo patamar das demais entidades fiscalizadoras profissionais, nem das autarquias.[2]
Não é apenas por essas características que se retira a OAB do campo do controle externo pelo TCU. O voto do ministro Edson Fachin julga que a OAB não é serviço estatal, possui natureza jurídica própria (não se confunde com outros conselhos profissionais) e suas contribuições não são tributárias.
Portanto, o STF riscou uma linha clara entre as entidades que estão sob o controle do TCU e a OAB, que não está. Delimitou-se, por consequência, a competência do TCU em prol de valores estabelecidos na Constituição da República e demonstrou-se que formas tradicionais do Direito não devem ser adotadas em todos os casos.
[1] WINTER, Marilena Indira. KANAYAMA, Rodrigo Luís. A OAB e o controle externo do TCU. Disponível em https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/oab-controle-externo-tcu-11102020.
[2] Conforme Egon Bockmann Moreira, “sua pureza advém da mistura, da mestiçagem entre os regimes. O que importa dizer que sua natureza e seu regime jurídico podem ser qualquer coisa, menos de direito público puro e simples. Ela não é, nem por analogia ou interpretação extensiva, algo que se pareça com uma autarquia. Não é assim que as coisas são no direito positivo brasileiro”. (Autorregulação profissional da OAB: inexistência de autorização constitucional para fiscalização pelo TCU. In.: Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro, v. 282, n. 2, p. 291-298, maio/ago, 2023, disponível em https://periodicos.fgv.br/rda/article/view/89866/84429, acesso em ago/2023).