Discurso de posse do presidente do TJ-PI, desembargador Aderson Nogueira
Poder Judiciário 2025-01-09
DISCURSO DE POSSE DO EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR- DESEMBARGADOR
ADERSON ANTONIO BRITO NOGUEIRA NA PRESIDÊNCIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PIAUÍ.
Excelentíssimo Senhor Presidente do Egrégio Tribunal de Justiçado Estado do Piauí, Desembargador Hilo de Almeida Sousa,
Excelentíssimo Senhor Governador do Estado do Piauí, Dr. Rafael Tájra Fonteles,
Excelentíssimo Senhor Presidente da Assembleia Legislativa do estado do Piauí, Deputado Franzé Silva,
Excelentíssimo Senhor Procurador Geral de Justiça do Piauí, Dr. Cleandro Moura,
Excelentíssimo Senhor Presidente da OAB, seccional Piauí, Dr. Raimundo Júnior,
Excelentíssimo Senhor Presidente do Sindicato dos Servidores desta Augusta Casa, Dr. Carlos Eugênio de Sousa,
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Excelentíssimos Senhores Advogados e Excelentíssimas Senhoras Advogadas, Senhores e Senhoras Servidores deste Tribunal,
Senhoras e Senhores,
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Há pouco menos de três anos, no dia 17 de fevereiro de 2022, eu tomava posse neste Tribunal, na condição de Desembargador, assim escolhido pelos pares para fazer assento nesta Casa, na condição de juiz de direito advindo do exercício da minha judicatura, sendo, portanto, pelo critério da antiguidade minha chegada a este templo maior de Justiça do Piauí.
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Repito uma passagem de meu discurso de posse, que muito bem resume quem eu sou, de onde vim, o que pretendo, aqui estando: ‘Sou juiz por convicção e vocação, e tenho tido a ventura e o privilégio de vivenciar, há quase 35 anos (já são 38), uma trajetória árdua e severa no ofício de Magistrado, sob os dons de grande formação humanística e permanente desejo de buscar uma equilibrada e balizada cultura jurídica.’
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Adiante, eu disse: ‘Recordo o início da carreira onde, em algumas comarcas, faltavam a máquina de escrever, e as audiências eram feitas manualmente, por vezes em esforço gigantesco das equipes de apoio, que chegavam a varar as noites para atualizarem os trabalhos e deixarem os juízes prontos para as audiências do dia seguinte. Hoje vive-se a era da informática, Processos Judiciais Eletrônicos, ferramentas que oferecem segurança e maior celeridade a todos os seus atores.’
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O mundo mudou, mas a pergunta é: o mundo melhorou? Ou, internamente, podemos fazer de outro modo: o que podemos fazer para melhorar ainda mais o mundo, exatamente nós que temos nas mãos o dever de fazer justiça? Se é difícil responder, muito mais difícil haverá de ser agir para desempenhar e desincumbir-se dessa tão nobre ou notável missão.
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Recordo e me vem à mente o sermão da montanha, e as palavras de Jesus, trazidas do Alto, lições de conduta e moral, ditando os princípios que normatizam e orientam a vida cristã. É uma oração que há de ser considerada como um resumo dos ensinamentos de Jesus a respeito do Reino de Deus, do acesso ao Reino do Pai, e da transformação que esse Reino produz no Homem.
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“Se toda a literatura se perdesse, e só se salvasse o Sermão da Montanha, nada estaria perdido”. O interessante é que o pensamento que inicia esta passagem não pertence a um cristão. Seu autor é Mahatma Gandhi. Imaginemos, pois, a profundidade dessa passagem, a grandiosidade desse tema, tão vasto, tão inquietante, e, por isto mesmo, tão misterioso.
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No destacado Sermão da Montanha, em Mateus 5-7, Jesus oferece um caminho adiante que se apega a altos padrões sem amarrar nosso status a eles. Em vez de uma apresentação de uma nova lista de regras a seguir, temos que o Sermão da Montanha é um convite ao próprio coração de Deus!
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É exatamente entre o caminho que separa e une a Terra e os Céus que existem os homens de boa vontade e de Fé, para ajustar a vontade de Deus ao desejo dos homens.
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Hodiernamente, não são poucas as críticas à Justiça, nas mais diversas camadas da população e na mídia em geral, contra o que é visto um Poder agigantado, por vezes letárgico e lento como um mastodonte; outras vezes se reclama do protagonismo acentuado ou exagerado do Poder Judiciário, tanto quanto à tomada de decisões, quanto a temas de maior impacto sobre a sociedade.
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Contra isso, digo que temos sido injustificadamente criticados, e as críticas por vezes são sombrias, mas sempre são sonoras, multiplicadas e replicadas inúmeras vezes, ainda que, em certos momentos, não passem de sinais vazios que sibilam nos ares, onde os interesses maiores da população estão, desafortunadamente, subjugados por outras vozes, que tentam ser ouvidas de forma mais robusta, e se apequenam porque se imaginam tomando o poder como argumento ou artifício ilegítimo para avançarem além dos limites da liberdade de expressão e da crítica justa e equilibrada.
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Sim, senhores desembargadores, minha oração se inicia atentando para um dos graves problemas que está em volta do Poder Judiciário, que exige um posicionamento firme e equilibrado de todos nós, nos Tribunais Estaduais, nas Cortes de Brasília, nas comarcas próximas e as mais longínquas.
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De todos os lugares, e por todos eles, o desejo verdadeiro da Magistratura brasileira, em especial, da magistratura piauiense, é fazer valer o direito do Cidadão e, com a mais absoluta consciência disso, o melhor de cada um de nós já está sendo colocado à disposição da sociedade, e muitas das críticas são indevidas e injustas, e, por vezes, até fazem parte de uma tentativa de manipulação da independência do Poder Judiciário, o que jamais será admitido por nenhum de nós.
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É contra tudo isto, contra essa tentativa de intimidação ou de manipulação do Poder Judiciário, e a favor da sociedade piauiense e da Justiça do Piauí, que chego à presidência deste Tribunal, com a certeza de contar com o valoroso apoio de todos os colegas, para levar adiante esta luta, que é renitente, no enfrentamento das dificuldades de produzir a melhor Justiça para todos, agindo e julgando com altivez, determinação, honradez, dignidade, sensibilidade, seriedade, compromisso, e … muito trabalho!
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Alguns falam numa “judicialização da política”, enquanto outros mencionam uma “politização da justiça”. Ambas as expressões traduzem uma avaliação negativa acerca da atuação do Judiciário, ao qual se imputa um extravasamento indevido de suas competências constitucionais, o que é indevido e inaceitável.
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Outras vezes, a censura assacada contra o Judiciário alega a morosidade na prestação jurisdicional, reclamação que, de resto, aparenta ser universal, tantas são as queixas registradas, aqui e em outros Países, com relação à demora na solução dos processos. Mas não se pode dizer isto da insigne Justiça do Piauí, onde a resolução dos processos em até 90 dias, para os processos criminais, e 180 dias para os processos cíveis tornou-se a meta a ser buscada com melhores esforços de todos nós. E, nesta senda, estamos todos nós imbuídos dos melhores propósitos, e com os objetivos vinculados a este projeto de justiça ágil, justa, perfeita.
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Esta presidência do Tribunal de Justiça do Piauí, em sua nova gestão, será conduzida, permanentemente, com foco na legalidade e na missão essencial da justiça: assegurar uma prestação jurisdicional célere, mas sempre fiel aos princípios constitucionais, como o devido processo legal, a ampla defesa e o julgamento justo. “A verdadeira eficiência está em unir agilidade e respeito inabalável à Constituição”, pois, “Agilidade não pode ser sinônimo de atropelo à Constituição, mas sim de eficiência com respeito aos direitos fundamentais”!
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A raiz do problema, de modo cabal, é o estreitamente da democracia e da paz, onde o reconhecimento e a proteção dos direitos dos homens e das mulheres estão na base das Constituições democráticas modernas. A paz, por sua vez, de modo sublime e superior, é o pressuposto necessário para o reconhecimento e a efetiva proteção dos direitos do homem em cada Estado e no sistema internacional. Aqui se fala da intervenção da Justiça dos homens, a Justiça brasileira, para eternizar esse ideal de bem universal.
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Ou seja, o processo de democratização do sistema de direito internacional se tornou o caminho obrigatório para a busca do ideal da paz perpétua, no sentido kantiano da expressão, que não pode avançar sem a gradativa ampliação do reconhecimento e da proteção dos direitos do cidadão, que se afirmam com a robustez do Poder Judiciário.
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Direitos do homem, democracia e paz são momentos distintos e necessários do mesmo movimento histórico: sem direitos reconhecidos e protegidos, não há democracia; sem democracia, não existem as condições mínimas para a solução pacífica dos conflitos. Sem a Justiça, a democracia sucumbe ante a sociedade de cidadãos, que assim se tornam quando lhes são reconhecidos os seus direitos fundamentais.
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A nossa justiça, a justiça brasileira, neste momento solene em que assumo a alta responsabilidade do comando do Poder Judiciário do Estado do Piauí, vai continuar administrando a paz estável e de todos nós, uma paz que não tem alternativa que não seja o sentimento e a busca da verdadeira Justiça, o que somente é possível quando existirem cidadãos que acreditam, vivenciam, e, até mesmo reverenciam a Justiça, porque se sentem amparados no resguardo de seus direitos, sabedores de que a intervenção do Judiciário é o corolário do chamamento da sociedade para solucionar conflitos, dirimir dúvidas, estabelecer limites, e, em casos extremos, de natureza criminal, estabelecer as punições devidas.
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O problema da boa Justiça tem início na busca de seus fundamentos basilares, no fundamento absoluto, irresistível, inquestionável, em que os direitos dos homens e das mulheres, na prática, envolvem as liberdades civis, a luta dos parlamentos contra os soberanos absolutos; a liberdade política em confronto com a busca das liberdades sociais, dos pobres e desassistidos que merecem dos poderes públicos não só o reconhecimento da liberdade pessoal e das liberdades negativas, mas também a proteção contra as violências, no mais amplo dos sentidos, sejam os vilipêndios morais, sociais, e tantos outros, todas de carecimento que os poderosos podem fazer para satisfazer por si mesmos.
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Aqui surge a clava forte da justiça, para impedir a desigualdade, acalmar a sociedade, e aclamar a paz social que defende a igualdade de direitos, de homens e mulheres, de todas as raças, de todos os credos, de todos os matizes sociais. É nesse equilíbrio dos desequilíbrios que a justiça se torna a verdadeira fonte do poder, do saber, da liberdade e do direito do Cidadão.
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Ao lado dos direitos sociais, se vê que os direitos não fluem todos de uma vez. Aí se agiganta o Poder Judiciário, que surge quando aumenta o poder do homem sobre o homem, que acompanha inevitavelmente o progresso técnico, o progresso da capacidade do homem de dominar a natureza e os outros homens, o que cria novas ameaças à liberdade do indivíduo, exigindo novos remédios para as suas indigências: ameaças que são enfrentadas através de demandas de limitações do poder; remédios jurídicos são providenciados através da exigência de que o Poder Judiciário intervenha de modo protetor.
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Afirmo, senhores e senhoras, que o importante não é fundamentar os direitos do homem, mas protegê-los. Não preciso aduzir aqui que, para protegê-los, não basta proclamá-los. O problema real que temos de enfrentar, assim, é imaginar medidas para a efetiva proteção desses direitos.
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É inútil dizer que nos encontramos aqui numa estrada desconhecida; e, além do mais, numa estrada pela qual trafegam dois tipos de caminhantes, os que enxergam com clareza, mas têm os pés presos, e os que poderiam ter os pés livres, mas têm os olhos vendados. É preciso distinguir as duas ordens, no caso: uma de natureza jurídico-política, outra, inerente ao conteúdo dos direitos em pauta, onde se delimita com a força deste Poder Judiciário.
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Vejo com otimismo a crescente importância atribuída aos direitos fundamentais, tanto no plano interno quanto no âmbito internacional, o que é revelador de um progresso moral da humanidade – eu creio nos homens, creio nas mulheres, confio que podemos ser sempre mais e melhores – e o grande desafio consiste em abandonarmos a habitual teorização, para, de imediato, colocá-los em prática.
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Nesse contexto, o Judiciário não pode jamais ser confinado à função de simples bouche de laloi (boca da lei), ao papel de mero intérprete mecânico das leis, sendo cada vez mais compelido a potencializar ao máximo sua atividade hermenêutica de maneira a dar concretude aos direitos fundamentais, compreendidos em suas várias gerações. Exato dentro disso, para assegurar a fruição desses direitos, de forma eficaz, significa oferecer a prestação jurisdicional célere, pois, como de há muito se sabe, e se repete, justiça que tarda é justiça que falha!
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Não é à toa a expressão na atual Constituição de um direito Cidadão, que é o direito à “razoável duração do processo”. E não se diga que não são inúmeras as dificuldades que emergem quando se busca colocar em prática esse direito.
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No mundo todo, surgiu o fenômeno que o sociólogo português Boaventura Souza Santos classificou de “explosão de litigiosidade”. Mais que um paradigma de múltiplos conflitos da sociedade moderna, representa, em verdade, uma busca do homem comum, do homem do povo, por seus direitos, que descobriu que pode alcançá-los pela via judicial. Esta é a porta que está aberta permanentemente na Justiça do Piauí: a porta ampla da busca do melhor direito, do justo e do firme, que, por tal razão sempre atual, se torna valioso e perfeito.
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As portas do Judiciário do Piauí dão guarida ao consagrado princípio da inafastabilidade da jurisdição, regra constitucional segundo a qual nenhuma lesão ou ameaça de lesão a direito pode ser subtraída à apreciação do Judiciário.
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Não bastasse isso, o Judiciário mafrense inaugurou uma postura hermenêutica mais ortodoxa, desvendando o Direito além das regras jurídicas positivadas na Constituição e nas leis, passando a fazê-lo também com base em princípios, superando a visão tradicional dos preceitos de caráter meramente programático.
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Valendo-nos dessa janela de oportunidades que o destino aparenta descerrar a mim, buscarei atingir, na Presidência desta Corte Estadual, algumas importantes metas, a seguir explicitadas.
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Primeiramente, pretendo acelerar a prestação jurisdicional, a inovação tecnológica de uso de meios eletrônicos para decisões e julgamento de todas as matérias que tenham prioridade de tramitação, com o uso dos meios legais disponíveis para tal intento.
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Procurarei, ainda, estimular formas alternativas de solução de conflitos, compartilhando, com a própria sociedade, a responsabilidade pela recomposição da ordem jurídica rompida, que, afinal, é de todos os seus integrantes. Refiro-me à intensificação do uso da conciliação, da mediação e da arbitragem, procedimentos que se mostram particularmente apropriados para a resolução de litígios que envolvam direitos disponíveis, empregáveis, com vantagem, no âmbito extrajudicial.
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Penso também na “justiça restaurativa”, que já vem sendo praticada, com êxito, no âmbito criminal, onde a atenção do Estado e da sociedade não se dirige, mais, exclusivamente, à punição do infrator, mas lança um olhar especial à mitigação das lesões físicas, morais, psicológicas e materiais sofridas pelas vítimas. Esse instituto poderá ser empregado, com igual sucesso, em outras áreas do Direito, em especial nos conflitos familiares, que podem ensejar a diminuição dos processos entre habitação e rápida solução de conflitos em áreas sensíveis.
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Por fim, desejo melhorar ainda mais a autoestima dos honrados magistrados e operosos servidores do Poder Judiciário do Piauí, cuja importância, no tocante à relevante tarefa de pacificação social, eis que realizam diuturna e anonimamente, um trabalho exponencial, que ainda não se vê reconhecida pela sociedade e autoridades em geral. Haveremos de fazê-lo mediante a correta divulgação dos serviços essenciais que prestam ao Poder Judiciário do Piauí, não raro, com risco para a própria vida e integridade física.
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Sem embargo de maiores outras obras físicas necessárias para a Corte piauiense, uma meta imediata é a construção de um amplo estacionamento que possa contemplar visitantes, as partes, e, especialmente, os servidores e advogados, que muito reclamam de um prédio imenso e novo, sem o estacionamento adequado que lhes dê conforto e segurança, e agora lhes será concedido esse direito, nosso dever.
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Quero poder contar com o Poder Legislativo e com o chefe do Poder Executivo, para que consiga levar adiante a proposta de recuperação das perdas salariais dos servidores, de modo a garantir-lhes uma remuneração condigna com o significativo múnus público que exercem, bem como lhes assegurar adequadas condições materiais de trabalho, além de lhes proporcionar a oportunidade de permanente aperfeiçoamento profissional mediante cursos e estágios, aqui e no exterior.
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Permitam-me concluir com uma frase de Martin Luther King, pronunciada em 1963, no Lincoln Memorial, em Washington: I have a dream; “Eu tenho um sonho”. Lá era um sonho de igualdade e de fraternidade para todos os americanos indistintamente. Aqui também tenho um sonho: o sonho de ver um Judiciário forte, unido e prestigiado, que possa ocupar o lugar que merece no cenário social e político deste Estado e do País. Que tenhamos um Judiciário à altura de seus valorosos integrantes, que possa colaborar na construção de uma sociedade mais livre, mais justa e mais solidária.
Muito obrigado!