STF mantém indicações de Lula em estatais, mesmo em desacordo com lei

JOTA.Info 2024-05-09

A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) considerou constitucionais os dispositivos da Lei das Estatais que trazem parâmetros para indicações políticas em empresas públicas, sociedade de economia mista e subsidiárias. No entanto, alegando segurança jurídica, os ministros mantiveram as indicações feitas pelo presidente Lula durante a vigência da liminar de Ricardo Lewandowski que permitiu as nomeações sem os padrões exigidos pela norma.

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Pela decisão do STF, mantém-se a quarentena de três anos para que dirigentes partidários assumam cargos de direção e de conselheiros administrativos em estatais. Também fica vedada a participação de ministros, secretários e parlamentares em altos cargos dessas empresas. O julgamento que discutia a validade da Lei das Estatais finalizou nesta quinta-feira (9/5). A discussão ocorreu na ADI 7331.

Na prática, o governo Lula perdeu sem perder no STF – isso porque as indicações de Lula ficam mantidas, embora a lei tenha sido considerada constitucional. No início do governo, a liminar dada pelo então ministro Ricardo Lewandowski garantiu que o governo Lula fizesse indicações para as estatais e ampliasse o seu poder de barganha política, como ocorreu, por exemplo, com Aloizio Mercadante no BNDES.

Prevaleceu a divergência trazida por André Mendonça, que entendeu pela constitucionalidade da lei, diferente do relator da ação, Ricardo Lewandowski. Acompanharam integralmente Mendonça os ministros Cármen Lúcia, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Edson Fachin, Alexandre de Moraes e Dias Toffoli. Mendonça somou ao seu voto a proposta de Dias Toffoli de manter as indicações feitas durante a vigência da liminar, para trazer segurança jurídica. Ficaram vencidos o relator, Gilmar Mendes, Flávio Dino e Nunes Marques.

Apenas Ricardo Lewandowski, relator, que está aposentado e não participou da sessão, não votou pela modulação dos efeitos, permitindo que o alto escalão já nomeado se mantenha em seus cargos.

Divergência

O julgamento começou na sessão de quarta-feira (8/5) e foi finalizado nesta quinta-feira (9/5) com os votos dos ministros Edson Fachin, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Gilmar Mendes. Os três primeiros votaram pela constitucionalidade da Lei das Estatais. Gilmar Mendes divergiu.

Já com a maioria formada, o ministro Flávio Dino tentou convencer os colegas de que a lei das estatais é inconstitucional na parte relativa à quarentena dos dirigentes partidários. Dino afirmou que não existe quarentena prévia e que devem surgir embargos de declaração sobre esse aspecto. No entanto, seu argumento não prosperou.

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A sessão de quarta-feira começou com o voto do ministro André Mendonça pela constitucionalidade da lei por entender que ela trouxe higidez às estatais – para confirmar sua posição, o magistrado correlacionou o lucro das empresas com o início da vigência da lei. Segundo Mendonça, ainda em 2016, as estatais melhoraram seus lucros quando passaram a ser administradas sob os parâmetros da Lei das Estatais.

“A lei das estatais foi fundamental para a prevenção de ilícitos, para a partir disso, termos resultados melhores dessas empresas. Penso que é preocupante, embora não se possa fazer correlação específica, uma redução dos resultados das estatais a partir de 2023. Por isso, reitero a improcedência total da ação”, afirmou Mendonça.

Na sequência, o ministro Gilmar Mendes discordou de Mendonça e disse não se sentir seguro para relacionar o lucro e o deficit das estatais com a vigência da lei, ainda mais em um curto período de tempo para a análise. “Não me parece adequado que haja relação direta entre os resultados financeiros positivos das estatais com a lei das estatais”.

O ministro Flávio Dino também concordou e brincou que é preciso cautela com certas conexões, ele se lembrou de um estudo que chegou à conclusão que o fim do Orkut elevou a expectativa de vida das pessoas. “É necessário ter cuidado com as relações de causalidade para evitar raciocínios que não tem suporte empírico”, afirmou Flávio Dino. Ao que o ministro Alexandre de Moraes retrucou em tom de brincadeira: “Mas eu concordo com isso. O fim das redes sociais ia aumentar a vida das pessoas”. Moraes tem travado uma disputa a favor da responsabilização das plataformas por conteúdos postados.

O ministro Dias Toffoli também divergiu do relator. Votou pela constitucionalidade da lei sem dar muitas explicações, mas entendeu que as nomeações feitas por Lula continuarão válidas.

Após as considerações dos colegas, Nunes Marques votou de forma remota, acompanhando o ministro André Mendonça, pela validade da Lei das Estatais. Porém, Nunes Marques reduziu a quarentena prevista de 36 meses para 21 meses.

De acordo com o ministro Flávio Dino a quarentena é válida para secretários e ministros se eles forem designados para cargos de direção em estatais que estavam ligadas às pastas em que atuavam. No entanto, no caso de dirigentes partidários a quarentena não deve valer. Dino entende que seria uma punição a quem faz campanha política, o que não condiz com a democracia e pode afastar a participação dos dirigentes partidários.

“Virou uma pessoa má porque participou de uma campanha eleitoral? O cidadão exerce o direito do regime democrático e é punido por isso?”, questionou.

Dino disse que a formação técnica e a aprovação por concurso não asseguram totalmente o fim da corrupção na Administração Pública, por isso, dirigentes partidários podem participar de cargos de direção em estatais. Ele lembrou que se a questão técnica blindasse a corrupção, não existiriam juízes corruptos, que vendem sentenças. “É uma pequena parcela, mas tem. Lamento!”.

O ministro Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso votaram pela constitucionalidade da lei por entenderem que foi uma opção legislativa criar parâmetros para as nomeações em estatais. Os dois também sinalizaram pela manutenção das nomeações realizadas durante a vigência da liminar.

Entenda o julgamento

O Tribunal julgou uma ação movida pelo PCdoB questionando um dispositivo da Lei das Estatais que estipula prazo de três anos para que dirigentes partidários assumam cargos de direção e nos conselhos administrativos de empresas públicas, sociedade de economia mista e subsidiárias. A lei também veda a participação de ministros, secretários e parlamentares em altos cargos dessas empresas.

O relator do caso, ministro Lewandowski, votou para afastar os dispositivos, sob o argumento de que essa vedação é inconstitucional e o prazo de quarentena, irrazoável. No entanto, o ministro André Mendonça pediu vista e interrompeu o julgamento após o voto do relator no dia 13 de março de 2023. Três dias depois, Lewandowski concedeu uma liminar mantendo a quarentena suspensa até que o julgamento termine.

A liminar de Lewandowski foi então para o plenário virtual, onde os ministros iriam decidir se ela seria mantida até ou retomada até o julgamento do mérito. O tema voltou à discussão na quarta-feira (8/5).