Lula sanciona lei que cria marco legal das eólicas offshore, mas veta ‘jabutis’
JOTA.Info 2025-01-13
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) comunicou na última sexta-feira (10/1) ao Congresso Nacional vetos parciais ao Projeto de Lei 576/2021, conhecido como marco legal das eólicas offshore. O texto, que regula o aproveitamento de energia eólica obtida em alto-mar, também modifica diversas legislações energéticas, como as leis nº 9.427/1996, 9.478/1997 e 14.182/2021, e havia sido sancionado na última sexta.
Os vetos incluem os chamados jabutis, dispositivos estranhos à matéria principal do texto que marcaram o texto durante sua tramitação legislativa. Na semana passada, a posição do governo federal já havia sido adiantada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), que afirmou que todos os ministérios interessados recomendaram veto aos trechos. “Há um grave prejuízo à economia popular. Há um problema efetivo de que a conta de luz das pessoas mais pobres é afetada por essa decisão”, disse.
Entre os trechos derrubados está o que incluía obrigações de contratação de energia em montantes fixos ou incentivos fiscais que poderiam resultar no aumento das tarifas de energia elétrica, além da contratação de termelétricas a carvão, gás natural e pequenas centrais hidrelétricas (PCHs). Os vetos agora serão submetidos à análise do Congresso Nacional, que poderá mantê-los ou derrubá-los.
“Em que pese a boa intenção do legislador, o dispositivo contraria o interesse público por aumentar as tarifas dos consumidores de energia elétrica, tanto os residenciais como os do setor produtivo, com efeitos negativos para os índices de preço e para a competitividade do setor produtivo nacional”, afirma a Presidência no documento. Segundo nota enviada ao Planalto por 12 entidades do setor de energia, os jabutis custariam R$ 440 bilhões até 2050, isto é, uma despesa anual de R$ 17,5 bilhões e um impacto de 7,5% na conta de energia.
A proposta previa a obrigatoriedade de contratação de usinas termelétricas movidas a carvão mineral, detalhando prazos, montantes e condições específicas para essas contratações, como extensão de contratos até 2050. O uso de carvão mineral, uma das fontes mais poluentes de energia, vai contra os compromissos ambientais assumidos pelo Brasil, como o Acordo de Paris, e da pauta prioritária do governo federal em torno da transição energética verde.
“As contratações de usinas de fontes fósseis não são compatíveis com os compromissos internacionais assumidos pelo País, bem como com as políticas públicas voltadas à transição energética, à mitigação das mudanças climáticas e à descarbonização da matriz energética brasileira”, escreveu a presidência.
Além disso, segundo o texto, ao impor contratos de longo prazo para termelétricas a carvão, a redação dificultaria a incorporação de novas tecnologias limpas e mais baratas que venham a surgir. Isso comprometeria o princípio da modicidade tarifária, que busca manter os custos de energia acessíveis para os consumidores.
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Os jabutis também implicavam em investimentos obrigatórios em infraestrutura logística ou de geração térmica, sem explicitação de custos. Essas obrigações, segundo os vetos, poderiam acarretar gastos adicionais a serem repassados aos consumidores, o que foi considerado contrário ao princípio da modicidade tarifária.
Outro veto feito foi ao dispositivo que permitia o uso de recursos para redução de tarifas na Amazônia Legal. A alteração vetada tinha o objetivo de aliviar, no curto prazo, os custos das concessionárias de distribuição, o que poderia beneficiar os consumidores locais. No entanto, a Presidência argumentou que isso prejudicaria iniciativas estratégicas, como a interligação da região ao Sistema Interligado Nacional (SIN) e a modernização das usinas térmicas que operam a óleo diesel, reduzindo custos e emissões a longo prazo. Hoje, a região da Amazônia Legal enfrenta altos custos de geração e grande dependência de combustíveis fósseis.
Outro ponto vetado aumentava o prazo de 12 para 24 meses para dar início a injeção de energia no caso dos minigeradores de fonte solar e manter os benefícios das regras antigas, com descontos nos encargos setoriais.
Outros dispositivos, ainda, propunham a contratação obrigatória de tecnologias ainda em estágio inicial de desenvolvimento, como a geração de energia a partir de hidrogênio líquido. A Presidência argumentou que esses projetos estão em “estágio incipiente de desenvolvimento” e apresentam incertezas em relação aos custos, podendo gerar impactos tarifários imprevisíveis.
Alterações em contratos e critérios já estabelecidos em legislações anteriores também foram derrubadas sob o argumento de que poderiam gerar insegurança jurídica. Um exemplo citado foi a mudança no índice de correção de contratos do Proinfa (Programa de Incentivo às Fontes Alternativas), que substituía o IGP-M pelo IPCA, afetando termos previamente pactuados entre as partes.
Leia a íntegra dos vetos presidenciais aqui.
Ao jornal Valor Econômico, o relator do projeto na Câmara, o deputado Zé Vitor (PL-MG), disse que vai se mobilizar para derrubar os vetos de Lula. “Tenho plena convicção de que os vetos vão ser derrubados. O que mancha toda a discussão é a questão do carvão, que interessa principalmente às bancadas do Sul do país”, afirmou.
Marco legal das eólicas offshore
O Projeto de Lei nº 576 de 2021, de autoria do senador e ex-presidente da Petrobras Jean Paul Prates (PT-RN), visava regulamentar o aproveitamento do potencial energético offshore, estabelecendo um marco legal para a exploração de energia em áreas marítimas no Brasil.
Parlamentares de estados com vocação energética e da oposição, como o senador Carlos Portinho (PL-RJ), também destacaram o impacto positivo do projeto na atração de investimentos e no fortalecimento das energias renováveis, especialmente em regiões como o Nordeste, com grande potencial para a geração eólica offshore.
No entanto, o texto também incorporou jabutis, que beneficiavam setores específicos, como a contratação obrigatória de usinas térmicas, gerando críticas de ambientalistas e especialistas e uma onda de reclamações de entidades de setores afetados. No Senado, o texto foi aprovado em 24 de fevereiro de 2021. Na Câmara dos Deputados, a votação ocorreu em 30 de novembro de 2023, na forma de uma subemenda substitutiva. Após ajustes, o texto retornou ao Senado e foi aprovado em 12 de dezembro, com 40 votos favoráveis e 28 contrários.