Moraes pede vista em ação que discute acesso a dados de empresas com sede no exterior
JOTA.Info 2022-10-05
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), interrompeu, por meio de um pedido de vista, nesta quarta-feira (5/10), o julgamento da ação que discute a aplicação de um acordo de cooperação internacional assinado entre o Brasil e os Estados Unidos para o compartilhamento de dados de usuários armazenados por empresas multinacionais de tecnologia. A discussão ocorre na ADC 51.
Para justificar o pedido de vista, Moraes lembrou que também interrompeu outros julgamentos com temática parecida e que discutem a proteção de dados sob a guarda de empresas de tecnologia e o relacionamento com autoridades brasileiras – a ADI 5.527 e a ADPF 403. Essas ações foram ajuizadas por causa de decisões judiciais em diferentes tribunais de Justiça brasileiros que determinaram a suspensão do aplicativo de comunicação WhatsApp em todo o Brasil, após o aplicativo informar que não poderia fornecer os dados requisitados pelos magistrados devido à criptografia. As ações paralisadas por Moraes também trazem discussões sobre a aplicação do Marco Civil da Internet.
O ministro também lembrou da decisão de suspender o Telegram para o cumprimento de decisões judiciais. Todas as ações interrompidas por Moraes podem repercutir nos inquéritos das fake news e no dos atos antidemocráticos, de relatoria do próprio ministro. No caso da ADC 51, o resultado pode gerar um eventual prejuízo para as investigações na obtenção de dados hospedados no exterior.
Até a interrupção do julgamento, o placar estava em 2 votos a 1 pelo não conhecimento da ação, ou seja, para que o Supremo nem discuta o mérito da questão. O relator, ministro Gilmar Mendes, votou pela constitucionalidade do MLAT, porém, destacou que essa não deve ser a única forma de a Justiça brasileira obter informações sobre comunicações privadas em caso de investigação judicial. Assim, as autoridades brasileiras podem se valer de outros meios como a intimação direta das empresas no Brasil ou carta rogatória.
A divergência pelo não conhecimento da ação vem dos ministros André Mendonça e Nunes Marques. Eles entendem que a associação autora não tem legitimidade para ingressar com uma ação de controle concentrado; defendem ainda a falta de controvérsia jurídica relevante que justifique a análise da matéria pelo Supremo. Se vencidos em relação ao conhecimento, os dois ministros manifestaram que vão acompanhar o relator no mérito.
A ADC 51 foi ajuizada pela Federação das Associações das Empresas de Tecnologia da Informação (Assespro Nacional), que pede ao Supremo que confirme a constitucionalidade do Decreto Executivo Federal 3.810/2001, que promulgou o Acordo de Assistência Judiciário-Penal entre o Brasil e os Estados Unidos (Mutual Legal Assistance Treaty – “MLAT”) e, assim, que ele seja o caminho utilizado pelas autoridades brasileiras para se conseguir informações sobre comunicações privadas de usuários.
De um lado, o Ministério Público defende que restringir o acesso dos dados de usuários hospedados no exterior via acordo bilateral pode impactar na velocidade das investigações e na própria soberania nacional, ao ter que submeter a outro país a decisão de repassar ou não informações importantes para as investigações brasileiras. Por outro lado, as empresas de tecnologia defendem que há risco à segurança dos dados dos clientes e pode haver descumprimentos da legislação do país sede da empresa.
O pedido da Assespro vem após distintas decisões que tribunais e magistrados brasileiros têm dado para obter acesso a provas importantes para investigações criminais, muitas delas buscando caminhos alternativos ao MLAT, ou seja, intimando diretamente as empresas no Brasil, ou por carta rogatória, sem recorrer ao acordo. De acordo com o MLAT, as requisições de dados devem ser feitas entre o Ministério da Justiça do Brasil e o Departamento de Justiça dos Estados Unidos.