A defesa do consumidor no Brasil

Consultor Jurídico 2019-09-11

O Código de Defesa do Consumidor completa 29 anos e lança luz a um importante debate sobre os desafios da evolução da economia digital e das relações de consumo do país. Desde a publicação do Código, o acelerado desenvolvimento tecnológico tem promovido o surgimento de novos mercados e novas formas de consumir.

Embora haja entendimento de que a norma tenha buscado promover a proteção das relações consumeristas, de forma geral, a regulação não funcionou suficientemente bem para estimular a competição e garantir o bem-estar do consumidor.

O fato é que, se por um lado, o aumento de informação promove a diminuição da assimetria entre fornecedores e consumidores, corrigindo uma das principais falhas de mercado e nos direcionando a um modelo mais próximo ao da concorrência perfeita, de outro, os consumidores deixam de estar atentos às informações mais relevantes sobre o produto ou serviço adquirido – especialmente se eles estiverem disponíveis em plataformas digitais-, desestabilizando novamente esta relação.

Apontamentos de estudiosos da economia comportamental destacam que o fenômeno pode ser ainda mais prejudicial para consumidores que não possuem a capacidade para diferenciar quais informações são de fato importantes.

Neste sentido, em razão do investimento insuficiente em infraestrutura para a regulação do setor consumerista, em alguns segmentos de mercados, serviços e produtos com qualidade e segurança questionáveis têm sido disponibilizados, reforçando a percepção de ineficiência para o estímulo à competição, com preservação e garantias para o bem-estar do consumidor.

Esse cenário contribuiu para criação de incentivos para o desrespeito ao consumidor, e, consequentemente, a um alto nível de judicialização das relações de consumo.

Diante disso, a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), do Ministério da Justiça e Segurança Pública, desde 2019, tem tomado como pauta prioritária a garantia dos interesses dos consumidores em mercados regulados, com a promoção de debates e operações em conjunto com diversas agências reguladoras, o que inclui o investimento continuado para o aprimoramento de políticas públicas e da principal plataforma do Governo Federal para o setor, a Consumidor.gov.br.

Além disso, a Senacon incentiva e participa da criação de novas ferramentas, como a recente “Não me perturbe”, que permite aos usuários de telefonia pedir o bloqueio de chamadas de telemarketing indesejadas. Vale registrar que, desde o seu lançamento, em julho deste ano, em apenas uma semana ultrapassou 1, 5 milhões de solicitações.

No universo digital, aplicativos e redes sociais também têm sido objetos de questionamentos quanto a possíveis práticas lesivas aos consumidores. Exemplo disso, são os diversos casos envolvendo tecnologia por supostas condutas lesivas à consumidores, em andamento junto à Senacon, e os casos envolvendo empresas de tecnologia como Google e Facebook já condenados pela Comissão Europeia e pela Federal Trade Commission dos Estados Unidos.

Essas situações não têm respostas simples e, muitas vezes, o seu endereçamento impõe a necessidade de adaptação da aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Esse aspecto, inclusive, tem sido objeto de constante estudo e debate pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), pois, ao mesmo tempo em que as novas tecnologias impõem desafios, elas também podem servir de vetores para a promoção da desjudicialização e para a transformação do perfil do consumidor.

Esse é, inclusive, um dos motivos pelos quais a Senacon busca ampliar o seu grau de participação na OCDE, para que, em um futuro próximo, possa iniciar o seu processo de adesão ao referido comitê. No caso, busca-se adequar a regulação e o desenho de políticas públicas voltadas para o direito do consumidor em conformidade com as melhores práticas internacionais.

Todos os aspectos aqui tratados, serão pauta de debate durante o “Congresso Internacional de Direito do Consumidor: para tratar das novas tendências e da perspectiva comparada”. Ao mesmo tempo em que se comemora o aniversário de nossa principal legislação consumerista, o Código de Defesa do Consumidor será livremente discutido em prol de novos avanços, para que seja promovido o aumento do bem-estar do consumidor, a partir de estudos que permitam a criação de políticas públicas baseadas em dados e evidências.