Justiça marca audiência para iniciar julgamento de ação penal contra Léo Lins

Consultor Jurídico 2023-10-18

A Justiça do Estado de São Paulo marcou a data para iniciar o julgamento do processo criminal contra Leo Lins. O humorista deverá se apresentar no dia 29 de janeiro à 16ª Vara do Fórum Criminal da Barra Funda para iniciar o interrogatório e as oitivas das testemunhas. Lins responde ao processo criminal pela suposta prática de racismo e crime de discriminação às pessoas com deficiência por fazer piadas com minorias nos shows de stand-up. Caso seja condenado, o humorista poderá ficar preso por 4 a 10 anos.

Para a defesa, Léo Lins é um personagem roteirizado para os shows de humor e não incentiva o racismo, a discriminação às pessoas com deficiência e não ofende ninguém em específico. “O que a gente deixa muito claro nas nossas defesas é que o que tem ali é um personagem. O que ele faz, o texto dele é propriamente para o palco. Ali no palco é o Léo Lins e na rua ele é o Leonardo Borges Lins. Então são pessoas divergentes”, afirmou o advogado Lucas Giuberti Marques.

No início de setembro, o humorista se tornou réu quando a juíza Gina Fonseca Correia, do Setor de Atendimento de Crimes da Violência contra Infante, Idoso, Pessoa com Deficiência e Vítima de Tráfico Interno de Pessoas (Sanctvs), aceitou a denúncia oferecida pelo Cyber Gaeco do Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP). Agora, o juízo da 16ª Vara do Fórum Criminal da Barra Funda rejeitou o pedido de absolvição sumária, confirmou o recebimento da denúncia e já marcou a audiência de Instrução, debates e julgamento.

Para o MPSP, Léo Lins desafiou as autoridades de vários estados em seus shows e nas redes sociais por divulgar conteúdos, supostamente, capazes de humilhar, constranger e injuriar minorias. Na denúncia, foi considerada a prática dos crimes do artigo 20, da Lei n. 7716/89, e artigo 88 da Lei 13.146/2015. Além disso, o Cyber Gaeco colhe provas para pedir a quebra do sigilo fiscal de Leo Lins.

Vitória de Léo Lins no STF

Recentemente, a defesa do humorista conseguiu uma vitória no Supremo Tribunal Federal (STF) ao reverter diversas restrições impostas pela juíza Correia. Ao julgar a Reclamação 60.382, o ministro André Mendonça entendeu que a magistrada impôs uma censura prévia ao humorista baseado em princípios genéricos, sem ter ordenado a exclusão de falas específicas, com a indicação do ilícito praticado.

“Limitou-se a exarar comandos genéricos de ampla proibição, fazendo largo uso do termo ‘quaisquer’ para se referir a ‘arquivos de vídeo, imagem ou texto’, ‘conteúdos’, ‘comentários’ etc. que, abstratamente, possam ser tidos como ‘depreciativo ou humilhante’ para ‘qualquer categoria considerada como minoritária ou vulnerável’.”, afirmou o relator.

Entretanto, a decisão do ministro cassou apenas as medidas restritivas impostas pela Justiça de São Paulo e não teve impacto na ação penal em curso. Para o ministro, cabe à Corte a proteção constitucional para garantir livre produção e apresentação de quadros humorísticos.

“Não há que se confundir o presumido animus jocandi de um profissional do humor com o dolo de se praticar crimes, necessário, em regra, para configurar a maior parte dos tipos penais existentes na legislação (art. 18, parágrafo único, do Código Penal). É certo que, como tudo no direito (e na vida), há limites para o exercício de qualquer atividade, e não se descarta a possibilidade de, por meio depiadas, cometer-se crimes. Todavia, é o ânimo interno do agente, a se extraído das circunstâncias de cada caso – inclusive e especialmente do ambiente – que vai delinear os indicativos da prática, ou não, de ilícitos criminais”, destacou.

Segundo a defesa, a denúncia pretende criminalizar o humor sob o pretexto de proteção das minorias. Antes do julgamento da reclamação, o advogado de defesa advogado Rodrigo Barrouin Crivano Machado afirmou que “Se ninguém pudesse fazer piadas sobre negros, acionariam o Porta dos Fundos, o Olhar sobre Rodas e todas as páginas que fazem piada com alguma minoria. Só as piadas dele são censuradas”.

Entre as piadas mencionadas no processo que originou a ação penal estão as seguintes:

“Eu acho, de verdade, que o tipo de humor que eu faço é o mais inclusivo de todos. Eu faço piada de tudo e de todos. Quer show mais inclusivo do que esse? Eu já cheguei a contratar intérprete de libras, só pra ofender surdo-mudo. Não adianta fingir que não ta ouvindo não…”. Em seguida, emite sons “imitando” pessoas mudas: “Ahn, ahn, ahn” e diz: “Sinal você entende. Entende esse aqui?” e em seguida: “Eu ia trazer um intérprete hoje, só não trouxe porque eu pensei: “ah foda se os surdos né?” (…) “Eu até aprendi algumas. Vou ensinar pra vocês. Sabe como o surdo e mudo fala bom dia? – Ahnnn! Boa noite? – Nhanhanhan”

“Acho que eu sou o único stand up no Brasil que no dia do show, por conta das ameaças, na porta do teatro, colocaram um detector de metal. (…) E graças ao detector a gente impediu a entrada de 1 canivete e 2 cadeirantes. Os cadeirantes eram muito meus fãs, vieram se arrastando me ver. Parecia um soldado na trincheira eles vindo assim”;

“Agora na Síria tem um anão (finge estar segurando o riso) combatendo o Estado islâmico. (…) Eu acho que esse anão ficou puto porque expulsaram ele do Estado Islâmico. Não dá nem pra ele ser um homem bomba! Vai ser o quê? Um homem estalinho? Eles usam anão em festa junina.” Em seguida, simula atirar anões no chão, emitindo os sons “Pá! Pá! Pá!” e prossegue: “Se tiver algum anão aqui, no final do show a gente estoura. Mais um processo! Pelo menos vai ser pequenas causas”

Leo Lins responde a mais de 29 processos. A ação penal contra o humorista segue em segredo de justiça.